De certa forma, os assessores do presidente dos EUA Joe Biden e do ex-presidente Donald Trump descrevem objetivos semelhantes para o debate presidencial da CNN nesta quinta-feira (27): mostrar o adversário como presidente da desordem e totalmente impróprio para o cargo.

Para dois homens que têm falado um do outro de forma constante nos últimos quatro anos, o debate organizado pela CNN em Atlanta representa um momento que pode gerar grandes consequências.

Segundo fontes próximas a eles, os dois candidatos estão cientes do que está em jogo e se reuniram com suas equipes para preparar ataques, elaborar réplicas e se mostrar como melhor escolha para as eleições de novembro.

As duas equipes passaram as últimas semanas trabalhando para afinar as mensagens sobre uma série de questões, da economia às relações exteriores, e também atacar a aptidão do rival para o cargo.

E cada um deles se viu distraído de alguma forma: Trump, pelo julgamento que consumiu meses no primeiro semestre deste ano; e Biden, por uma sequência de viagens intensivas ao exterior e uma dolorosa saga judicial para a sua família.

Objetivos e preparação diferentes

No entanto, as semelhanças acabam por aí.

Como cada um se prepara para o debate é, em última análise, um microcosmo de suas diferenças como candidatos. Cada um entrará no estúdio da CNN com objetivos divergentes.

Nas sessões de preparação, Biden se concentrou em formas de responsabilizar Trump no palco do debate, espelhando a estratégia política que a sua Presidência e sua campanha vêm implementando há meses.

“O presidente vem ficando cada vez mais agressivo em comentários recentes sobre Trump e planeja levar esse tom para o debate”, contou um membro da campanha de Biden.

Depois de meses sugerindo que o eleitorado americano estava desinteressado na corrida de 2024, o lado de Biden vê o debate como um tipo de primeiro bloco da campanha e uma oportunidade de apresentar os contrastes dos candidatos em frente a uma audiência nova e engajada.

Trump, entretanto, tem o objetivo de assegurar aos eleitores que ele pode ser um líder mais estável e mais eficaz do que o democrata, apesar das questões jurídicas que o cercam e de uma abordagem profundamente polarizada da política.

Assim, parte da sua preparação para o debate se concentrou menos na política e mais na retórica.

Trump já sofreu em alguns debates políticos, preferindo divagar e generalizar, especialmente quando não conta com a ajuda de um teleprompter.

Nos debates anteriores, ele também foi rápido ao demonstrar agressividade, incluindo ao falar sobre os seus adversários e atacar os moderadores, em atitudes que repercutiram entre os espectadores nos meses que se seguiram.

“Provavelmente vou ‘negociar’ com três pessoas, mas tudo bem. Eu já fiz isso antes”, comentou Trump a apoiadores, referindo-se a Biden e aos dois moderadores da CNN.

“Vou debater com três pessoas em vez de uma, em vez de metade de uma pessoa”, reforçou.

Biden vai a retiro para se preprar

Para se preparar para o debate na CNN, Biden foi a Camp David, o retiro presidencial no pé de montanhas, para vários dias de intensa discussão e preparação.

O complexo isolado de alojamentos rústicos em Maryland ajudou, no passado, a concentrar Biden e a sua equipe em momentos importantes, como os discursos do Estado da União – um dos principais eventos do ano para o presidente.

Os preparativos deveriam evoluir a partir de discussões informais sobre tópicos, perguntas e respostas potenciais até chegar em debates simulados de 90 minutos mais formais.

A Casa Branca está aventando a possibilidade de que o presidente e a sua equipe possam viajar de Camp David diretamente para Atlanta, dependendo da quantidade de prática que restar naquele momento.

Os assessores estão compilando pastas de perguntas, com possíveis respostas para cada uma delas, sobre uma ampla gama de tópicos para o presidente avaliar.

Há quatro anos, Biden teria dado respostas detalhadas sobre todos os tópicos previstos, em alguns casos rejeitando totalmente certos temas.

Em outros pontos, ele pediu que os assessores aprofundassem mais alguns assuntos ou enquadrassem as respostas de uma maneira diferente.

Ron Klein, ex-chefe de gabinete de Biden, lidera esse trabalho de preparação do presidente para o debate com Trump.

Presidente dos EUA, Joe Biden, em seu gabinete na casa de campo oficial de Camp David, no Estado norte-americano de Maryland / Casa Branca/Divulgação (12.fev.22) via Reuters

Além de conhecer e trabalhar para o democrata durante décadas, Klein é o treinador de debates mais experiente do partido, tendo trabalhado com candidatos democratas em quase todas as disputas presidenciais nas últimas três décadas.

Bruce Reed, outro auxiliar de longa data que atualmente é vice-chefe de gabinete de Biden, foi encarregado de examinar pilhas de material impresso e horas de aparições anteriores de Trump para alimentar as sessões de prática.

No início deste ano, Reed liderou o processo de compilação de toda a “substância política” e a linha retórica para formatar naquilo que se tornou o discurso do Estado da União de Biden.

Já Bob Bauer, advogado pessoal de Biden, deveria atuar novamente como Donald Trump em sessões de debate simuladas, segundo duas fontes ouvidas pela reportagem.

Bauer, que foi um dos principais advogados das campanhas presidenciais e do governo de Barack Obama, escreveu num livro recém-lançado que incorporou o seu “pior Trump” para ajudar Biden a antecipar as armadilhas e os ataques do seu adversário em 2020.

Superstição?

Embora o presidente dos EUA saiba do profundo conhecimento de sua equipe sobre sua candidatura e sua Presidência, um conselheiro contou que também pode existir um pouco de superstição nessa preparação do candidato democrata.

“Ele venceu com essa equipe há quatro anos, por isso vai ficar com eles agora”, afirmou uma fonte.

Outros conselheiros seniores próximos de Biden, incluindo o chefe de gabinete Jeff Zients e os conselheiros seniores da Casa Branca Anita Dunn, Mike Donilon e Cedric Richmond, também estão envolvidos nos preparativos.

A equipe do democrata defende há muito tempo que, uma vez que os eleitores comecem a prestar atenção à corrida eleitoral, eles terão a escolha mais clara em mente a partir dos contrastes que o presidente sempre apresenta, mas que ainda não foi sentido nas pesquisas.

Com a expectativa de que dezenas de milhões de norte-americanos vejam o debate, essa teoria será testada. Os assessores ressaltaram que pesquisas recentes mostraram a intenção entre eleitores de acompanhar o evento.

A campanha de Biden planeja se apoiar fortemente nos comentários anteriores de Trump que, embora amplamente cobertos pelos meios de comunicação políticos, podem não ter sido registrados pelo eleitor médio, de acordo com fontes envolvidas nas discussões.

Ainda segundo uma das pessoas ouvidas pela reportage, Ron Klein, ex-chefe de gabinete de Biden e experiente coach de debates dos democratas, disse que se preparar para debater com Trump deve ser simples, porque “ele só diz oito coisas”, referindo-se à tendência do ex-presidente de desabafar queixas familiares nas redes sociais.

Enquanto a lista desses “trumpismos” – e suas réplicas – está sendo alimentada e adaptada, há uma que certamente vai aparecer, de acordo com uma fonte envolvida: a sugestão de Trump, em dezembro de 2023, de que ele governaria como um ditador, “a partir do primeiro dia de governo”.

Trump participa de “sessões de política”

Enquanto isso, Donald Trump contou com a ajuda de alguns dos seus principais candidatos para vice-presidente, bem como de senadores, especialistas políticos e aliados externos, para ajudá-lo a se preparar para o debate desta quinta-feira.

Nas últimas semanas, o ex-presidente participou de cerca de uma dúzia dessas reuniões privadas, apelidadas de “discussões políticas” informais por sua campanha, segundo disseram à CNN fontes familiarizadas com as sessões.

Os temas dos encontros variam desde a melhora de suas mensagens sobre a economia, a situação na fronteira e o crime, até aos seus pontos de vista sobre o aborto, as guerras no Oriente Médio e na Ucrânia, e como enquadrar a sua condenação de fraude empresarial, explicaram as fontes.

No início deste mês, Trump se reuniu com JD Vance, senador de Ohio, e com membros da antiga equipe presidencial em Mar-a-Lago para uma dessas sessões, de acordo com duas fontes com conhecimento direto da reunião.

A sessão informal foi focada nos temas da economia, incluindo a melhor forma de atacar Biden a respeito da inflação, uma questão que a campanha de Trump defende ser a principal preocupação para os eleitores.

Trump se teve uma conversa semelhante com os senadores Marco Rubio, da Flórida, e Eric Schmitt, do Missouri, na sede do Comitê Nacional Republicano em Washington, DC, após sua reunião com a Câmara e os senadores republicanos em Capitol Hill.

Entre os tópicos discutidos estavam a democracia e como responder às inevitáveis perguntas sobre o ataque de 6 de janeiro de 2021 ao Capitólio dos EUA, incluindo a resposta de Trump ao tumulto incitado pelos seus apoiadores naquele dia.

Os gerentes de campanha de Trump, Susie Wiles e Chris LaCivita, também participaram da reunião e ofereceram conselhos sobre como resolver o problema de forma mais eficaz.

Outras sessões foram realizadas com os conselheiros seniores Kellyanne Conway e Stephen Miller, bem como com o seu ex-diretor interino de Inteligência Nacional, Richard Grenell.

Debates simulados

Segundo as fontes, nenhuma das sessões de Trump até a semana passada incluiu debates simulados.

Em 2020, o republicano enfrentou a portas fechadas o ex-governador de Nova Jersey Chris Christie, que atuou como Biden.

Do lado de Biden, o papel de Trump este ano permanece aberto, com a expectativa de que o advogado pessoal de Biden, Bauer – que atuou como Trump há quatro anos – pudesse facilmente reprisar o seu papel.

“Nós separamos especialmente sessões durante as quais eu era deveria agir como o meu pior Trump – da forma mais pessoalmente insultante e desarticulada que Trump pode ser”, lembrou Bauer no seu livro lançado esta semana, descrevendo a sua prática de “mentir, insultar e intimidar ao longo das sessões simuladas”.

Na verdade, tentar se preparar para uma ampla gama de cenários imprevisíveis com os quais Biden poderá ser confrontado quando estiver a poucos metros de distância de Trump foi um dos objetivos mais importantes dos debates simulados no outono de 2020, de acordo com aqueles que estavam na sala. Os cenários incluíam tudo, desde respostas longas e tediosas à possibilidade de Trump lançar insultos pessoais.

No último ciclo, os assessores de Biden foram particularmente sensíveis ao ataque de Trump a membros da família de Biden na fase de debate.

“Parte do objetivo do processo de preparação era aclimatar Biden à ideia de que Trump poderia dizer coisas horríveis sobre a família dele, seus filhos, para que assim Biden estivesse preparado e não se sentisse desprevenido pelo estilo de Trump”, disse a ex-diretora de comunicações da Casa Branca, Kate Bedingfield.

Hunter, filho de Biden, foi recentemente condenado em três acusações de crime de posse de armas – um caso que o presidente e os seus assessores certamente estão vendo como potencial linha de ataque.

Jogo de expectativas

Os conselheiros de Trump, que estão cautelosos em usar as palavras “preparação para o debate” no que diz respeito ao ex-presidente, têm consistentemente minimizado a noção de que ele requer o tipo de preparação que outros candidatos – e especificamente, Biden – precisam para um debate tão importante.

Em vez disso, eles citam os comícios de Trump e entrevistas com a imprensa como exemplos de como Trump está se preparando para enfrentar Biden, incluindo selecionar perguntas de membros amigáveis da audiência em eventos recentes.

“O presidente Trump aceita inúmeras entrevistas duras todas as semanas e faz longos discursos em pé nos comícios, demonstrando uma resistência de elite”, disse o conselheiro sênior do Trump, Jason Miller, que mencionou os esforços de Trump antes do debate em um comunicado.

Antes do debate de Atlanta, Trump planeja fazer um comício de campanha na Filadélfia, uma cidade que Biden já visitou várias vezes este ano enquanto trabalha para replicar a sua vitória de 2020 na Pensilvânia.

Os aliados e conselheiros do ex-presidente apontam que Trump não só apareceu em vários palcos de debate presidencial na última década como também já debateu com Biden antes – uma razão fundamental, dizem eles, para a abordagem menos convencional dos preparativos.

Mas, embora a versão da preparação do debate da campanha Trump seja diferente do planejamento tradicional em que os candidatos anteriores – e até o próprio Trump – se envolveram, pessoas próximas do ex-presidente disseram à CNN que sua equipe reconhece que ainda há trabalho a fazer antes de subir ao palco em Atlanta.

“Não há dúvida de que o debate mostrará que Trump é o candidato mais forte e a melhor escolha, especialmente quando se vê o forte contraste com Biden, física, mentalmente e assim por diante. Mas isso não significa que Trump não deveria ou não esteja se preparando”, afirmou uma pessoa próxima de Trump, que pediu anonimato para falar abertamente sobre o tema.

“Ele não vai para o debate sem fazer a lição de casa”, acrescentou essa mesma fonte.

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Fonte : CNN BRASIL

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